Muitos pais, professores e cuidadores questionam o que é normal e esperado durante o desenvolvimento infantil. O fato é que durante o percurso de seu desenvolvimento, as crianças passarão por alguns momentos em que irão fazer birra, mentir, matar aula, desobedecer, desafiar e até mesmo apresentar algum comportamento agressivo. Mas e quando tais características são constantes? Como é possível saber se tais comportamentos estão dentro do esperado ou se são patológicos?
Um primeiro aspecto que deve ser enfatizado é que todos os nossos comportamentos são aprendidos e para que se faça a distinção deles entre normal e patológico deve-se observar se ocorrem esporadicamente, de forma isolada ou se são caracterizados como síndromes.
Um segundo aspecto relevante é entender o que são comportamentos agressivos e comportamentos antissociais. Quando se pensa em comportamento agressivo imagina-se que o mesmo esteja invadindo o direito alheio, de forma que não respeite os limites da convivência social.
Os comportamentos agressivos são constituídos por várias atitudes sociais inábeis, tais como gritar, ameaçar, quebrar ou xingar. Deve-se atentar o fato de que o temperamento da criança e o ambiente em que ela se encontra influenciam na expressão da agressividade em diferentes graus. Sugere-se que crianças com comportamentos agressivos constantes possam evoluir para práticas antissociais.
A definição mais utilizada para o comportamento antissocial é “qualquer conduta que reflita a violação das regras sociais ou atos contra os outros, incluindo comportamentos como roubo, mentiras, vandalismo e fugas”. São comportamentos que visam benefícios próprios a qualquer custo e independem dos danos que podem ser causados aos demais.
Novamente, é importante falar que os comportamentos agressivos, desafiadores e antissociais podem aparecer durante o desenvolvimento de crianças e adolescentes e são considerados normais, especialmente nas idades pré-escolares e na adolescência. O preocupante é quando passa a existir um padrão consistente dessas condutas, causando prejuízos aos demais e à sociedade.
Os transtornos disruptivos são caracterizados por comportamentos de transgressão de regras, comportamentos desafiadores e antissociais, que provocam incômodo nas pessoas, gerando impacto no ambiente social e possui implicações severas. Costuma-se apontar que as crianças com algum tipo de transtorno disruptivo geram sentimentos negativos nas pessoas, incluindo raiva, frustração e ansiedade.
Essa classificação mais geral inclui dois transtornos: o Transtorno de Conduta (TC) e o Transtorno Desafiador Opositivo (TDO). Ambos atingem crianças e adolescentes. Quando as características globais citadas são apresentadas por pessoas com mais de 18 anos são classificadas como Transtorno da Personalidade Antissocial (TPAS).
Considera-se que o Transtorno Desafiador Opositivo preceda o Transtorno de Conduta. Isso porque se verifica que as crianças que recebem o diagnóstico de TDO têm maior risco de desenvolver posteriormente o TC. E da mesma forma, aqueles com TC possuem maior propensão a serem diagnosticados com TPAS após os 18 anos.
Argumenta-se que os aspectos do TDO estão presentes no TC, sendo que o diagnóstico do TDO não é realizado se os critérios para o TC são satisfeitos. Resumidamente, considera-se o TC como um quadro mais amplo e mais complexo que o TDO.
O Transtorno Desafiador Opositivo (TDO) se caracteriza por um padrão de comportamentos negativista, desafiador, desobediente e hostil direcionado para figuras de autoridade. Segundo os critérios diagnósticos do DSM, o TDO deve persistir por no mínimo seis meses e apresentar no mínimo quatro dos seguintes comportamentos com frequência:
- Perde a calma com frequência;
- Frequentemente tem discussões com adultos;
- Constantemente desacata ou se recusa obedecer a solicitações ou regras de adultos;
- Adota comportamento incomodativo;
- Frequentemente responsabiliza terceiros por seus erros ou comportamentos inadequados;
- Demonstra irritação com facilidade;
- Geralmente aparenta estar com raiva e ressentido;
- Mostra-se rancoroso ou vingativo.
Geralmente, o TDO se manifesta antes dos oito anos e possui pouca probabilidade de aparecer após o início da adolescência. Esses comportamentos devem ser observados em lugares públicos, além da escola e do ambiente familiar.
Outra característica importante é que devido ao excesso de atividade, a dificuldade de se acalmar e uma grande reatividade pode-se facilmente confundir o diagnóstico com o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH).
No transtorno de conduta, crianças e adolescentes apresentam comportamentos antissociais ou muito difíceis de lidar que trazem prejuízos significativos, mantendo um padrão repetitivo e persistente em que viola normas e regras sociais. Em geral, demonstram pouca empatia e apresentam pouca ou nenhuma preocupação pelos sentimentos, desejos e bem estar dos demais.
Na maioria dos casos, não apresentam sentimentos de culpa ou remorso e justificam seus comportamentos agressivos com a suposta hostilidade que outros lhes direcionam. Observa-se que o TC está associado com início precoce de comportamento sexual, consumo de bebidas alcoólicas, uso de substâncias ilícitas e ações perigosas.
O diagnóstico para TC tem se mostrado difícil de ser realizado, pois esses indivíduos apresentam a capacidade de manipular o ambiente e as pessoas, dissimular seus comportamentos e demonstrar sentimentos de culpa para evitar punição.
De acordo com o DSM, para que o TC seja diagnosticado, deve-se apresentar pelo menos três dos seguintes critérios nos últimos 12 meses, em que pelo menos um deles esteja presente nos últimos 6 meses:
- Provocações, ameaças e intimidações frequentes;
- Frequentes lutas corporais;
- Uso de armas capazes de causar danos corporais;
- Crueldade física com pessoas;
- Crueldade com animais;
- Roubo com confronto com a vítima;
- Coação sexual;
- Incêndios provocados com o intuito de causar danos;
- Destruição deliberada de propriedade alheia;
- Invasão de casas, prédios ou automóveis alheios;
- Mentiras frequentes para obter ganhos ou para se esquivar de obrigações;
- Roubo de objetos valiosos sem confronto com a vítima;
- Frequente permanência na rua à noite com a proibição dos pais (início antes dos 13 anos);
- Pelo menos duas fugas de casa enquanto vive na casa dos responsáveis legais;
- Faltas frequentes na escola (início antes dos 13 anos).
O TC pode ser classificado em dois subtipos:
- Tipo com início na infância: é definido pela presença de pelo menos um critério antes dos dez anos de idade.
- Tipo com início na adolescência: é definido pela ausência de quaisquer critérios antes dos 10 anos de idade.
Esses subtipos ainda podem ser classificados como:
- Leve: os problemas de conduta causam danos considerados pequenos aos demais. P. ex.: mentir.
- Moderado: os danos causados pelos problemas de conduta estão situados entre o leve e o severo. P. ex.: furtos sem confronto com a vítima.
- Grave: os problemas de conduta causam sérios danos aos demais. P. ex.: sexo forçado.
Quanto à avaliação psicoterápica é necessário realizar uma avaliação minuciosa para que uma linha de base possa ser traçada. É importante conhecer a pessoa, sua demanda, sua história de vida e de aprendizagem, as relações que estabelece com o meio. Tudo isso ajuda no levantamento e realização do diagnóstico topográfico e funcional, em que pode-se apontar diagnósticos diferenciais e escolher as melhores técnicas e direcionamento do processo terapêutico.
Deve-se ressaltar que a avaliação deve ocorrer durante todo o processo psicoterápico, pois novas interpretações podem ser formuladas, novas situações ocorrem e novas habilidades podem surgir. Dessa forma, quando realizada uma avaliação constante pode-se focar as metas, verificar resultados alcançados, restabelecer intervenções e objetivos terapêuticos.
FONTE:http://mundodapsi.com/mundo-crianca-transtornos-disruptivos/